Com o primeiro texto com o título acima publicado aqui neste site, não houve pretensão deste articulista de esgotar o tema e nem será com este. Os dois fenômenos, valorização ou desvalorização, têm causas tão vastas que qualquer opinião sobre um deles poderá faltar itens que o leitor pensou e este escriba, não.
Como todos os interessados em arte têm percebidos, nos últimos três anos está a ocorrer uma quantidade de leilões com ofertas de pinturas e esculturas como nunca houve na história brasileira. São obras de pintores e escultores consagrados, outros desconhecidos, de pintores amadores com algum prestígio no local de origem, obras sem assinatura e outras descaradamente falsas. Caberá ao leitor de olhar treinado separar o bom do ruim. Se ainda não tem esse olhar, aconselhe-se com alguém que o tenha e ele concorde em lhe orientar. O aprendizado em arte habitualmente requer leituras, folhear livros de arte, visitas a museus e exposições em galerias tantas vezes até que em certo momento há um “clic” interno e passamos a distinguir arte de não arte.
Depois de adquirir esse olhar, as peças boas ou más serão automaticamente selecionadas internamente pelo colecionador e pelas suas perceptíveis qualidade e preço. Este deve ser coerente com o mercado das galerias sérias, caso contrário é possível ser lesado. Há falsários capazes de criar um pastiche incrível, mas não são capazes de pintar uma produção própria. Não são criativos, mas copistas. Os bons quadros e até algumas obras-primas foram oferecidas neste ano de pandemia provavelmente por causa do desfalque financeiro de algumas famílias, que vendem patrimônio familiar artístico por necessidade. São ofertas que podem valorizar o artista no seu conjunto de obras, uma vez que muitas delas ficaram guardadas durante décadas sem exposição alguma.
Há galerias e leiloeiros sérios que oferecem trabalhos excelentes que exigem do vendedor e exibem para o comprador a provenance da peça, recibo de venda ou um documento de autenticidade assinado por um especialista ou de algum parente do pintor. São exigências atuais por causa da quantidade de falsificações surgidas pelo país sobretudo dos pintores consagrados. Há alguns anos, o quadro que precisava de expertise ou documento do pintor era um quadro suspeito. Hoje é quase obrigatório tê-lo em mãos para comprovar sua autenticidade, fenômeno a ocorrer apenas no Brasil. As grandes casas de leilões europeias e americanas jamais citam nos catálogos que há documentos comprovando a autenticidade de lotes oferecidos. Elas têm especialistas que se certificam de tudo antes de colocar algo em hasta pública.
O leitor deve ficar atento por que os preços das obras em leilões sérios são sempre semelhantes a outros do mesmo pintor oferecidos em galerias. Os quadros suspeitos ou falsos são surpreendentemente baratos. Como acreditar em quadro a óleo de Tarsila, de Di Cavalcanti ou Guignard oferecido pelo equivalente a trezentos ou quatrocentos dólares? Milagres não existem nesse mercado. As ofertas dessa natureza têm sido tão frequentes que o próprio mercado está alijando galerias e leiloeiros coniventes com essas impossibilidades. Se não ocorrer essa expulsão, corre-se o risco do próprio mercado deixar de vender/comprar quadros de artistas importantes por suspeitar de todos. Fala-se aqui de artistas mortos por que os falsários raramente produzem um pastiche de pintor vivo.
Em leilões com pintura de alta qualidade, a valorização ou desvalorização dependerá de quantos compradores estão interessados nela provocando competição na plateia. Aí o preço pode ir às alturas, como confirma qualquer leiloeiro experiente. Dependerá também da vaidade pessoal do colecionador de tê-la, a quem pertenceu anteriormente, as suas dimensões, se ela tem uma história na trajetória do pintor ou dela própria, se está catalogada em exposições de galerias e museus e como foi tratada fisicamente ao longo de sua existência. Aquarelas ou óleo que ficaram expostas, mesmo ocasionalmente, ao sol e o colecionador nem percebeu as mudanças processadas nesse período, serão menos valorizados que aqueles que permaneceram sempre à sombra e por isso estão melhores conservados.
São todas essas exigências que os compradores fazem rapidamente ao olhar o catálogo do leilão ou a própria peça. E fatos incríveis também acontecem antes ou durante esses eventos. Em 2018 um quadro de vaso de flores de Burle Marx foi oferecido em leilão. Por uma dessas coincidências inacreditáveis, o antigo dono procurou a galeria e o leiloeiro e comprovou com documento policial que ele foi furtado vinte e cinco anos antes. É claro que durante esse período o quadro passou por alguns vendedores e compradores até chegar ao dono atual que se sentiu à vontade para leiloá-lo. Sua compra tinha sido revestida de bona fides e nada o impedia de vendê-lo. Criminosa foi a venda inicial de quem a furtou e, se foi baratíssima, também de quem o comprou.
Há casos de furtos encomendados e cujos quadros desapareceram para sempre. A Chácara do Céu, do Rio de Janeiro, perdeu obras primas por furto realizado há anos e até hoje não esclarecido e cujas peças podem estar em qualquer país do mundo. Portanto, leitor, cuidado de quem compra e por quanto compra.