A sessenta quilômetros de Paris, na direção de Rouen, às margens do rio Sena, na Normandia, existe um pedaço de céu chamado Giverny. São a casa e os jardins criados por Claude Monet — o grande pintor francês do impressionismo —, que ali viveu desde 1883 até sua morte em 1926.
Monet, que nasceu em Paris no dia 14 de novembro de1840, passou sua juventude no Havre, onde seu pai era comerciante. Foi aí que ele conheceu Boudin, que o influenciou decisivamente. Em 1856, Monet, com dezesseis anos de idade, expôs uma paisagem do vale de Rouelles, no Sena Inferior. Esse quadro e alguns outros que se seguiram não agradaram entretanto à família do jovem pintor, que exigiu que ele abandonasse suas veleidades artísticas para se dedicar ao comércio como fazia o pai. Monet não concordou e, para sobreviver, engajou-se num regimento na Argélia, onde permaneceu por dois anos, no fim dos quais adoeceu devido ao clima por demais inóspito da região. Seus pais, entre vê-lo morrer e seguir a profissão artística, acabaram concordando em trazê-lo de volta à França para estudar pintura, desde que ele tomasse aulas com algum mestre de reconhecida competência. Monet ingressou então no ateliê de Charles Gleyre, sem obter, no entanto, qualquer proveito, pois ele não tinha a menor admiração pelo estilo acadêmico do professor.
Foi por essa época que Monet começou a se interessar pelas obras de Manet (1832-1883), depois de ter assistido à exposição de 1863 no então chamado Salão dos Recusados, fixando-se nas cores e harmonias obtidas por iustaposição, que aparentemente se contrapunham, mas que na realidade se complementavam, e que acabaram por lhe abrir novos horizontes.
Esse salão, que praticamente assinala o nascimento do impressionismo, foi uma iniciativa de Napoleão III que se referiu à conveniência de reunir em um local à parte os quadros recusados pelos jurados do Salão de Paris. O interessante é que uma boa parte do público — que ali compareceu para se divertir às custas daqueles que tiveram suas obras ridicularizadas pelas invectivas acadêmicas saiu convencida de que estava diante de obras dotadas de grande força artística, muito embora ainda não lhe fosse possível explicá-las.
Já em 1866 Monet conseguia expor no Salão Oficial, tendo seu quadro Retrato de Camille obtido bastante sucesso. Mas no ano seguinte ele viu recusado Les Femmes au Jardin, sendo ainda acremente criticado por Manet: "Ao ar livre! É isto que existe ao ar livre?" No entanto Monet foi estimulado por Frédéric Bazille (1841-1870), que comprou o quadro e ainda sustentou o artista durante um período em que este passava por sérias dificuldades financeiras.
Foi então que Monet resolveu abandonar definitivamente suas obras figuristas para se dedicar totalmente ao paisagismo. Os personagens de suas composições surgiam apenas como simples elementos acessórios, cuja finalidade, era somente a obtenção de um conjunto harmonioso. O pintor emprega então o seu talento na execução de paisagens em Trouville, Deauville, Fécamp, Sainte-Adresse e Etretat, todas no Havre.
Em 1870 explode a guerra franco-prussiana e Monet parte para Londres. Um ano antes ele havia sido bastante elogiado pela crítica com o quadro La Grenouillère (O Pântano), que despertou grande admiração no pintor François Daubigny (1817-1878). Este aproveita a ida de Monet para a capital britânica e o apresenta a Paul Durand-Ruel (1831-1922), que dirigia a famosa galeria Durand-Ruel fundada por seu pai, Jean-Marie Fortuné, e que era grande incentivador dos impressionistas.
Durante o período da guerra Monet dedicou-se a estudar as obras de paisagistas japoneses, principalmente Hiroshige (1797-1858), que usava o nome artístico de Ichiryusai. Depois de um período na Holanda, Monet retornou à França, fixando-se em Argenteuil, às margens do Sena. Aí ele transformou um barco em ateliê, a fim de melhor poder observar os efeitos da luz sobre as águas. É por essa ocasião que Monet se junta a diversos artistas que tiveram suas obras recusadas no Salão de Paris e fundam uma Sociedade Anônima (de pintores, escultores e gravadores) com a finalidade de organizar uma exposição. Esta foi feita em 1874, no ateliê do fotógrafo Félix Tournachon, dito Nadar (1820-1910).
A exposição foi alvo das mais severas críticas e zombarias. Uma das obras de Monet, Impression, Scleil Levant (Impressão, Nascer do Sol), serviu como pretexto para que Louis Leroy, um cronista parisiense do Charivari, batizasse ironicamente a nova forma de pintura, chamando a mostra de Exposição dos Impressionistas, donde a denominação de impressionismo, adotada pelos próprios pintores. Mas a partir de 1880 o grupo impressionista começa a cindir-se. Foi quando Monet, depois de uma curta estada em Vetheuil, desceu ainda mais o curso do Sena para instalar-se, definitivamente, na casa por ele adquirida em Giverny, onde deu início a uma nova fase de sua produção artística pintando uma série de paisagens estudadas em diferentes horas e diferentes incidências de luz, mas sempre sob o mesmo ângulo. Os Álamos e a Catedral de Rouen (pintada quarenta vezes) são os exemplos mais notáveis dessa fase. A partir de 1900 até a data de sua morte ele pinta a série Ninféias, num total de dezenove painéis. Estimulado por seu amigo Georges Clemenceau, ele oferece a obra ao governo francês. Hoje os painéis se encontram em duas salas ovais no Jardim das Tulherias em Paris.
Depois da morte de Monet, a casa de Giverny foi herdada por seu filho, Michel, que por sua vez, ao morrer, a legou à Academia de Belas-Artes. A partir daí Giverny ficou praticamente ao abandono e, em 1977, a casa e os jardins, em ruínas, mostravam-se quase irreconhecíveis. Foi quando o Professor Gerald van der Kemp, conservador do Palácio de Versalhes, se viu indicado para supervisionar os trabalhos de restauração da propriedade, em financiamento de um grupo de admiradores de Monet, que angariaram dois e meio milhões de dólares.
Como explica o Professor Kemp, tal obra só foi possível porque a casa do artista continuava com seu ambiente intacto, e, embora abandonada, os móveis originais lá se encontravam e podia-se reconstituir fielmente o traçado e as plantas dos jardins e dos lagos, de acordo com planos, fotos e quadros deixados pelo artista. A casa foi pintada no mesmo tom rosa de antes e as janelas — que abrem para os jardins cobertos de glicínias, dálias, gerânios, rosas e margaridas — no mesmo verde-escuro.
As peças do mobiliário foram arrumadas exatamente como Monet as conservava; as gravuras japonesas, que tanto influíram em sua pintura, foram restauradas e identificadas (algumas, verdadeiras raridades assinadas por Ichiryusai e Utamaro) e recolocadas no hall de entrada e nos corredores.
Transformados em Fundação e Museu Claude Monet, a casa e os jardins se encontram exatamente como os criou o pintor, que neles encontrava a sua grande fonte de inspiração. Passeando por eles, o visitante imaginará vultos de moças e meninas, em seus vestidos brancos de verão e chapéus de palha, ou vislumbrará Monet, afagando a sua longa barba branca, entretido com os reflexos da luz em uma ninféia. Diariamente ele percorria os caminhos da propriedade à procura de novas imagens. As flores, os chorões, as pequenas pontes japonesas, o barco e o lago das ninféias o inspiravam na criação de seus quadros. Armando seu cavalete, Monet abria o grande pára-sol e pintava a mesma cena em diversas horas do dia. Ele acreditava que isolar um momento, pintando-o uma única vez, era negar a passagem do tempo, pois a cada instante a luz muda e, com ela, o aspecto da paisagem — a pura essência do impressionismo.