O juiz Jair Santana, de Santa Luzia, concedeu hoje liminar impedindo leilão de três anjos barrocos de Aleijadinho, atendendo à suspeita de que pertenceiam à Matriz da cidade, construída no século 18

 

Belo Horizonte - A Justiça de Minas Gerais concedeu hoje uma liminar impedindo que três anjos barrocos, supostamente esculpidos por Antônio Francisco Lisboa (1738-1814), o Aleijadinho, sejam levados a leilão. A venda de sete peças atribuídas àquele que é considerado o maior escultor do período barroco brasileiro está prevista para acontecer entre os dias 12 e 16 deste mês, na Galeria Leone Leilões, no Rio de Janeiro. O juiz Jair Eduardo Santana, da 2ª Vara Cível da Comarca de Santa Luzia, na região metropolitana de Belo Horizonte, deferiu o pedido de liminar em uma ação civil pública impetrada pela Associação Cultural e Comunitária da cidade.

 

A entidade quer comprovar se as peças de madeira pertenciam à Matriz de Santa Luzia, construída no século 18. Com base em fotografias de jornais, uma moradora teria reconhecido uma das imagens, que ficava no altar principal da igreja durante as festividades. Ontem, o médico e colecionador João Bosco Vianna Gonçalves, de 87 anos, admitiu em entrevista ao Estado, por telefone, do Rio de Janeiro, que comprou, “a mais de 50 anos”, peças da igreja de uma pessoa que se identificou como zeladora do templo. Ele, que é natural de Santa Luzia, também disse que não possuía nenhum documento que comprovaria a transação. A decisão do juiz, que teve como base matérias jornalísticas, não descreve e nem identifica quais seriam os anjos da coleção de João Bosco. Ele relata em sua sentença que, de acordo com a Constituição de 1988, o patrimônio cultural “é objeto de obrigatória proteção estatal” e determina que as imagens sejam retiradas do leilão, ficando sob “custódia provisória” do Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (Iepha-MG).

 

“Se, de fato, pertencem ao acervo cultural do Barroco Mineiro os santos tratados nos autos por certo que não poderão ser levados ao comércio”, disse o magistrado na sentença. “Entendo que o caso posto à apreciação não comporta solução diversa, a não ser pela retirada, de leilão que se pretende realizar”. No despacho do juiz, João Bosco e a Galeria Leone são citados.

 

De acordo com a superintendente do Patrimônio Edificado do Iepha, Elizabeth Sales de Carvalho, o órgão, a pedido do Ministério Público Estadual, fará um levantamento histórico das peças para comprovar se a origem delas é mesmo a Matriz de Santa Luzia. “Temos de provar que essas imagens pertencem à igreja. Provando, elas retornarão”, afirmou.

 

Mal-estar - O proprietário da Galeria Leone, Antônio Leone, criticou a liminar concedida pelo juiz mineiro e disse que irá recorrer da decisão. “Eu vou recorrer em nome de todos os colecionadores que mantêm um imaginário de arte no Brasil”, afirmou, garantindo que o leilão não será suspenso.

 

Leone considerou a decisão judicial “um negócio meio doido”. “Se fosse assim tinha de tombar todas aquelas coleções mineiras da mostra Brasil 500 Anos”, observou, sem esconder a irritação. “Isso vai criar um mal-estar. Quem tem acervo vai começar a vender fora do Brasil”, avaliou.

 

O colecionador João Bosco evitou fazer comentários sobre a decisão,mas disse que considera injusta a possibilidade de perder a guarda dos anjos. “’É natural que eu tema, embora eu ache injusto”.

 

 

Eduardo Kattah