O ministro da Cultura, Gilberto Gil, disse ontem em uma nota que o Banco do Brasil violou a Constituição ao decidir retirar o trabalho de Márcia X da mostra "Erotica - Os Sentidos da Arte", em cartaz no CCBB (Centro Cultural Banco do Brasil) do Rio.
A obra censurada pela direção do Banco do Brasil mostra dois pênis feitos com terços religiosos.
Um trecho da nota diz o seguinte: "Segundo a Constituição brasileira, é "livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença". Por isso, não pode haver mais em nosso país nenhum tipo de interdição a obras de arte e a outras formas de expressão".
O ministro emitiu a nota após um questionamento da Folha --o jornal queria saber o que Gil achara da decisão do BB de retirar a obra da exposição.
"Toda censura é inaceitável. Os critérios para seleção de obras exibidas numa exposição devem ser de natureza estética, sob a responsabilidade de curadores ou de quem for designado para a tarefa", afirma o texto.
"Acreditamos na capacidade de discernimento crítico dos espectadores e do público em geral. Assim como acreditamos que toda tutela na relação entre obra de arte e espectador é inaceitável."
O ministro diz esperar que o Banco do Brasil reveja sua decisão "em nome da liberdade garantida por lei". Antes de Gil, o presidente da Funarte, Antonio Grassi, havia criticado a decisão do BB de censurar o trabalho de Márcia X.
"Decisão corporativa"
Procurada pela Folha, a assessoria do BB afirmou que a direção do banco estatal respeitava a posição do ministro, mas que não comentaria a nota por enquanto.
Ontem à noite, diretores do banco se reuniram com a produtora de "Erotica", Maria Ignez Mantovani Franco, para decidir o que fazer com a próxima etapa da mostra, em Brasília, que será inaugurada no próximo dia 15, se o cronograma não for alterado. Os integrantes da Opus Christi querem que a obra "Desenhando com Terços", de Márcia X (1959-2005), também seja excluída da exposição em Brasília.
A direção do Banco do Brasil decidiu retirar o trabalho da exposição "Erotica" no último dia 20 depois de receber cerca de 800 e-mails de uma corrente dirigida pelo grupo católico Opus Christi, segundo a assessoria do banco.
O BB diz que a retirada da obra não foi ato de censura. Foi uma "decisão corporativa", segundo a expressão da assessoria do órgão. Os católicos ligados ao grupo ameaçavam cancelar suas contas no banco se a obra não fosse retirada da mostra. O BB dobrou-se diante da ameaça.
A exposição foi vista por 56 mil pessoas em São Paulo, sem qualquer tipo de incidente.
MARIO CESAR CARVALHO
da Folha de S.Paulo