É sempre gratificante ver quando uma artista mergulha de coração aberto no território experimental das artes à procura da sua identidade. Com esta experimentação, vem junto o exercício pleno da liberdade e, ao mesmo tempo, vem junto à possibilidade de atualizar e sintonizar os processos criativos autorais com nosso tempo, ou seja, trata-se do exercício pleno da mais pura contemporaneidade.
Nesse contexto, a artista Anita Colli vive um frutífero momento. Após passar por diferentes técnicas e linguagens, a artista alça novos vôos e chega aos procedimentos que têm como base as apropriações e as aglutinações. Este processo contínuo de apropriações e aglutinações de objetos permeia o processo criativo da artista nos últimos anos.
Conceitualmente, é importante destacar que a obra de Anita revela heranças “duchampianas” nessas construções criativas ao se apropriar de materiais descartáveis de laboratório para propor novos modelos estéticos. Esses materiais passam por uma desconstrução conceitual, procurando um esvaziamento dos seus significados literais para, em seguida, propor novas possibilidades mediante uma recontextualização cada vez mais poética, aberta e experimental.
No aspecto estrutural da obra de Anita também podemos perceber uma herança construtiva, uma opção pelo pensamento concreto e racional, com base na aglutinação de objetos multiplicados. Ao multiplicar a peça, multiplicam-se também seus sentidos e significados, propondo novas leituras e novos olhares.
A série dos anelídeos é um dos resultados do seu interesse pela produção tridimensional.
São obras criadas e produzidas a partir de estruturas construtivas de fragmentos repetidos e organizados, procurando fluidez nas suas poéticas visuais.
A série das girolas é composta por estruturas suspensas, que lembram móbiles interativos. Neste momento, Anita dialoga no aspecto conceitual e não estético com Alexander Calder, o pai da arte aleatória conhecido por seus móbiles fantásticos. As construções de Anita incorporam movimento, provocado pelo sutil deslocamento do ar em volta dessas peças. São estruturas leves que oscilam suavemente.
Na série cirandas, Anita evidencia a questão participativa por parte do espectador, aproximando-o de sua obra. São objetos táteis que têm a sua forma aberta e mutável e, com a manipulação do espectador, oferecem múltiplas possibilidades e descobertas. Com esta série de arte participativa, Anita dialoga, no campo conceitual e não estético, com Lygia Clark, uma das pioneiras no território da interatividade. Anita incorpora o aspecto lúdico e interativo nestas obras ao criar estruturas maleáveis, flexíveis e cambiantes, frutos de uma mentalidade transformadora e aberta. Ela questiona a materialidade e a rigidez das suas estruturas e, ao incorporar linhas transversais com fios flexíveis interligando esses fragmentos, Anita quebra essa rigidez ao adicionar formas sinuosas e consegue fazer dobras, reestruturando o plano desses agrupamentos.
Na série de fotogravuras, Anita apresenta diversos estudos estéticos das múltiplas possibilidades de agrupamentos e composições.
A artista nos propõe uma relação libertadora com a arte a partir da experimentação plena e transformadora do nosso cotidiano. Ao superar a barreira do território estético no campo da arte, Anita almeja atingir uma dimensão maior do espaço, desconstruindo e reformulando o vazio.
Na sua sensível trajetória artística Anita percorre um caminho construído com talento, coerência e uma personalidade singular.