A Vincent
Quantos obras percorri,
Atento aos detalhes,
Traços, cores, veladuras,
Sombras, luzes, formas,
Assinaturas fantásticas.
Ia saltando no tempo,
Percorrendo séculos de pintura,
Até que deparei com seus ciprestes
Tocando o céu, abraçando astros.
O magnetismo de sua paleta me prendeu
No labirinto dos traços de sua tela,
Como nos sonhos de Kurosawa.
Penetrei sua paisagem,
Senti o desnível do caminho,
Saudei o casal que passeava
Vislumbrando aquela natureza
Ao mesmo tempo rústica e bela.
Vincent, eu sabia que você estava pintando,
Senti o cheiro de óleo trazido pelo vento,
Vi o gestual de sua sombra
Aplicando tinta com precisão genial.
Vincent sua silhueta com chapéu
É inconfundível,
Eu queria ouvir sua voz,
Mas você acabara de assinar o quadro,
Desarmou o cavalete e caminhou depressa.
Pássaros pretos na contra-luz
revoaram com asas arqueadas,
Para não destoar dos seus traços.
Ainda pude ver sua sombra,
Modulada na vegetação rasteira,
Com cores fortes e expressivas.
Ali estava eu, onde você pintava,
Enquadrei com os dedos sua composição.
O vigia do museu,
Cumprindo seu papel,
Alertou para que eu não tocasse no acervo.
Olhei para minhas mãos,
Achando que tinha impressões de tinta fresca...