MARIA HIRSZMAN - especial para o Estado - SÃO PAULO - Figura central do modernismo nacional, referência indiscutível para a produção brasileira das últimas décadas, Flávio de Carvalho (1899-1973) tem na diversidade uma de suas características mais fascinantes. Quando se tenta defini-lo por uma das diversas áreas em que atuou, pelos seus trabalhos mais marcantes ou pelos efeitos - algumas vezes bombásticos - de suas ações, tem-se a impressão de estar omitindo um aspecto desse artista multifacetário.
Estudo para Sr. de Noite, de 1954
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Na tentativa de responder quem foi afinal Flávio de Carvalho, a retrospectiva que será inaugurada esta noite no Museu de Arte Moderna (MAM) de São Paulo propõe uma abordagem ampla, na qual se mesclam obras, projetos e muita documentação (fotográfica e escrita), organizada em termos cronológicos e de linguagem.
O início da mostra é dedicado aos trabalhos do Flávio de Carvalho arquiteto, com a exibição de uma série de ousados projetos que ele cria no fim dos anos 20 e início dos 30 numa clara estratégia de ruptura com os padrões em voga e tentando abrir o debate para além da tradicional disputa entre o classicismo e o neocolonial, ainda na época defendido por Lúcio Costa. Há também pequenos nichos criados para tratar de aspectos importantes de sua obra, como a relação com o teatro, a dança e o figurino; bem como uma ampla coleção de textos, ilustrações e livros importantes para sua trajetória que pontuam toda a exposição.
Pode-se dizer, no entanto, que a pintura e o desenho são o principal fio condutor que conduz o espectador pela produção de Carvalho, desde as primeiras pinturas dos anos 30 até a última tela pintada por ele, no ano de sua morte. É na década de 30 que ele se engaja ferozmente na tentativa de mexer o circuito artístico local, envolvendo-se em ações como o CAM (Clube de Arte Moderna) e o Salão de Maio. Nesse período, segundo o curador Rui Moreira Leite, ele defende o surrealismo e o abstracionismo - correntes claramente identificáveis em sua obra e presentes no trabalho dos artistas que apresenta ao público local - como sendo as duas forças motoras da produção artística do período.
O retrato, gênero marcante em sua produção, também tem forte presença ao longo da mostra, tanto por intermédio das autorrepresentações (em distintas fases de sua vida), como pelas já célebres telas retratando amigos como Mário e Oswald de Andrade. Infelizmente o MAC negou o empréstimo da Série Trágica, conjunto de desenhos a carvão em que o artista retrata sua mãe no leito de morte e que é considerada uma de suas obras maiores.
Moreira Leite, que há mais de duas décadas estuda a obra de Carvalho, também reservou um espaço importante para as experiências desenvolvidas por ele, como a realizada em 1931, quando andou em sentido contrário a uma procissão na Rua Direita, em São Paulo, sendo quase linchado (ler acima) ou quando criou, em 1956, um traje masculino em que as calças dão lugar à saia, mais arejada e adequada aos homens dos trópicos.
Flávio de Carvalho e a Cidade do Homem Nu - MAM. Parque do Ibirapuera, Portão 3, telefone: 5085-1300. 10h/ 17h30 (fecha 2ª). R$ 5,50. Abre nesta quinta, 15, 20 h. Até 13/6