“Só a mentira do artista não é total, pois só inventa a si mesmo.”
E. M. Cioran
Com a imaginação, o artista recria o mundo. Ele contempla, manipula e transforma a realidade. Se o espectador tem medo de não entender uma obra, é porque ele não percebe que não há nada para entender ou não entender. Sempre há uma margem de dúvida, de magia, de incompreensibilidade, que deixa o espectador indeciso, por não encontrar uma solução imediata para este sistema de signos que escapa ao seu modelo de compreensão do mundo.
O artista não é um sujeito que tenha coisas ou segredos para dizer a um público. Ele inventa, investiga conhecimentos e relações; mais do que idéias e objetos, ele inventa um mundo paralelo. Ele altera a ordem do visível como um mágico; é um criador de ilusões, um falsário. (Orson Welles)
O menor percurso entre o artista e sua obra não é a linha curva, muito menos a reta; é o devaneio, mesmo que seja o devaneio da razão que levou Mondrian a observar o mar, o céu e as estrelas, e depois definiu plasticamente esta realidade através de linhas horizontais e verticais que se cruzam. A obra de arte é invenção da fantasia do artista, que vive plagiando a si mesmo (J. L. Borges). As imagens que se mostram parecem ocultar outras imagens; no fundo desta superfície visível, estende-se um território obscuro. Aprendemos, com a arte, que sempre conservamos uma geografia sombria ao redor de nós. A fala sobre a obra de arte pode criar uma realidade distante daquela que o olhar contempla.
A arte desafia o olhar. Muitas vezes, ela se refugia em zonas de silêncio, à espera da contemplação solitária (Bachelard), livre de conceitos e preconceitos, como um mistério insondável. É bom frisar: o discurso não faz a obra, mas há uma exigência do pensamento frente aos materiais e conceitos que envolvem a teoria e a prática.