A Era do Impressionismo
Tendência estilística que dominou a pintura, sobretudo francesa, no último quartel do século passado. Anti-acadêmico e anti-romântico, o Impressionismo preparou o caminho para todas as manifestações artísticas que se lhe seguiram, e teve em Manet, Monet, Renoir, Píssarro, Sisley, Morisot, Degas, Brazille, Boudin, Cassatt, Cézanne, Gauguin, Seurat, Signac, Lautrec e Van Gogh seus principais representantes.
A denominação impressionismo tinha de inicio cunho pejorativo, e foi utilizada por um crítico de arte, Louis Leroy, para designar a espécie de arte que pudera ver na primeira coletiva da Société Anonyme des Artistes Peintres, Sculpteurs et Graveurs, realizada entre 15 de Abril e 15 de Maio de 1874 em Paris (Lê Charivari, 25 de Abril de 1874). Derivava do nome de um quadro de Claude Monet então exposto: “Impressiona u Soleil Levant” (1874). Não era porém a primeira vez em que a condição de Impression, peculiar a todas as obras participantes da mostra de 1874, era posta em relêvo por críticos: Castagnary, por exemplo, afirmara em 1864, referindo-se à pintura do holandês Jongkind: “nela, tudo não passa de impressão”. E Daubigny era tido, em 1865, como “chefe da escola da impressão”.
Para Camille Mauclair, pode o Impressionismo ser sintetizado em poucas palavras: “reação contra o espírito greco-latino e contra a organização escolástica da pintura”. Em verdade, a conceituação da tendência é bastante difícil, a não ser que aceitemos a definição sumária de um artista, Eugène Boudin, que se acha por assim dizer, na origem mesma do movimento: “movimento que leva a pintura ao estudo da luz plena, do ar livre e da sinceridade na reprodução dos efeitos do céu”.
Entre os precursores longínquos do Impressionismo merecem ser citados, entre outros, Watteau, Claude Lorrain, Ruysdael, Poussin, Turner, Bonington, Constable, Delacroix, Moreau, Hubert Robert, Canaletto, Fragonard, Guardi e uma série de outros pintores; precursores diretos, contudo, foram alguns românticos franceses, agrupados na chamada Escola de Barbizon (segundo certo crítico, “a casa de campo do Romantismo”), Corot, Coubert; foram, acima de todos, Johann Barthold Jongkind e Louis Eugène Boudin, os que até certo ponto podem já ser considerados pintores impressionistas. O crítico Claude Roger- Marx, estudando o movimento, definiu-o como “conseqüência das sucessivas descobertas levadas a efeito pelos românticos, por Corot, Coubert e a Escola de Barbizon”.
Como movimento organizado, o Impressionismo durou de 1874 a 1886, período que assistiu à realização de suas oito exposições gerais: em 1874, 1876, 1877, 1879, 1880, 1881, 1882 e 1886. Da primeira mostra inaugurada no atelier do fotógrafo Maurice Nadar, circunstância que não deixa de possuir alto significado, já que até certo ponto a fotografia viera desferir um golpe profundo na pintura realista, participaram nada menos de 30 pintores, a saber: Astruc, Attendu, Béliard, Boudin, Bracquemond, Brandon, Bureau, Cals, Cassatt, Cézanne, Colin, Debras, Guillaumin, Latouche, Lepic, Lépine, Levert, Meyer, Molins, Monet, Morisot, Mulot-Durivage, De Nittis, os dois Ottin, Pissarro, Renoir, Robert, Rouart e Sisley. Muitos de tais artistas acham-se hoje esquecidos, como Astruc, Cals e outros, ou relegados a discreto segundo plano, como Lépine e Guillaumin. Outros, contudo, entre eles Cézanne, Monet, Morisot, Pissarro, Renoir e Sisley, podem ser tidos entre os pintores mais ilustres do século XIX.
A aceitação do Impressionismo, por parte do público – aceitação impossível nas quatro primeiras exposições – começa a ter lugar em 1880, por ocasião da quinta mostra; a qual reúne 12 quadros de Degas, 15 de Morisot, 16 de Pissarro, 7 de Gauguin, e ainda obras de Guillaumin e Mary Cassatt. Sem embargo, a respeito da mostra assim escreveu no Fígaro de 9 de Abril o crítico Wolff: “Com as exceções de Degas e de Berthe Morisot, o resto não vale a pena de ser visto, e menos ainda discutido. É a pretensão, na nulidade. Nem arte, nem estudo, figuras desproporcionadas, sempre a mesma tinturaria cheia de vácuo. Esses homens não se modificam, não podem esquecer nada, pois nada aprenderam. Por que um homem como Degas perde seu tempo nessa aglomeração de nulidades? Por que não faz como Manet, que há muito desertou do Impressionismo, cansado de rebocar indefinidamente a cauda dessa escola detestável?”
A referência a Manet é importante: esse artista, que só muito relativamente se considerava um impressionista, estética a que o conduzira sua cunhada, Berthe Morisot, trocara o recinto das mostras do grupo pelo Salão Oficial, no qual acabara de ser aceito após inúmeras recusas, desde que expusera no de 1865 sua célebre tela “Olympia”. Manet, por muitos considerado como o mais importante precursor do impressionismo, em verdade converteu-se à tendência apenas em 1875, com a obra “Lê Grand Canal”, feita em Veneza. Ainda um ano antes, convidado a tomar parte na primeira coletiva do grupo, recusara-se terminantemente. O crítico François Mathey chama-o de “clássico, passando por criador do Impressionismo, quando não é senão a última malha de uma longa tradição pictórica: Chardin, Watteau, Corot, Manet”, o que não deixa de ser procedente, tanto mais que no Salão de 1881 é lhe concedida a Medalha de Segunda Classe (pela obra “Retrato de Pertuiset, o Caçador de Leões”, hoje no Museu de Arte de São Paulo), e ainda em 1882 a Legião de Honra, um ano apenas antes de sua morte.
Na exposição de 1881, do núcleo primitivo apenas restam Degas, Pissarro e Morisot, mas na seguinte ei-los quase todos de novo reunidos, com a exceção de Degas. Dois pintores que expõem na oitava e derradeira mostra impressionista, Signac e Seurat, terminarão por indicar a essa tendência um caminho inteiramente novo, baseando-se nas teorias físicas de sábios como Helmholtz, Rood e Chevreul.
Novo caminho indicarão também três pintores algo à margem do Impressionismo, se bem que dois tenham mesmo participado das mostras do grupo. Esses três pintores chamam-se Paul Cézanne, Paul Gauguin e Vincent van Gogh, e ocupam lugar importante na história da pintura, não só pelo que foram, como pelo que possibilitariam. A chamada arte moderna, com efeito, nasce com a contribuição de cada um deles, sendo Cézanne responsável pela conceituação de um novo espaço pictórico, Gauguin pela imposição de uma fórmula sintética abrangendo forma e cor num todo simples e abstrato, Van Gogh pela vitória da cor sobre o desenho.
Passando agora ao estudo da obra de cada um dos chamados impressionistas, chegar-se-á à conclusão de que os mais típicos representantes da tendência, seus mais fiéis defensores, foram Monet, Renoir, Pissarro e Sisley, sendo que apenas Pissarro participou de todas as oito exposições do grupo. Monet, considerado chefe inconteste da escola, foi aluno de Boudin, e muito deveu igualmente a Jongkind. Em suas ultimas obras, executadas já nos primeiros anos do século atual, praticamente atingiu aos limites em que as designações de figurativa e não figurativa, dadas à pintura pela crítica de arte contemporânea, perdem todo e qualquer significado. É o momento das “Nymphéas”, série iniciada exatamente em 1900.
É extraordinário o fascínio que no momento exercem, internacionalmente, as pinturas dos componentes do grupo, as quais atingem no mercado de arte cotações simplesmente fabulosas, mormente se comparadas aos preços ínfimos de poucos anos atrás (1960: Cézanne, “Lês Pommes”, 200.000 dólares; Degas, “Trois Jockeys”, 65.000 dólares; Gauguin, “Femme Assise”, 106.400 dólares; Monet, “Water Garden, Giverny”, 54.800 dólares; Pissarro, “Avant Port de Dieppe”, 35.000 dólares; Renoir, “Nu Debout dans L’Eau”, 106.400 dólares).
Na música e na literatura. O Impressionismo, como estilo, se tornou comum a outros tipos de expressão, como a Música e a Literatura.
Na Música, com Debussy, Ravel e Resphigi, representou uma reação antiwagneriana. Os compositores visavam à dissolução de certas estruturas rígidas de algumas formas musicais.
Segundo Laloy “é uma música que não obedece às leis da sensação; puramente auditiva, como visual é, da mesma maneira, a pintura impressionista”.
Na Literatura, o Impressionismo derivou do Realismo, e o termo, só recentemente posto em uso por críticos e nsaístas, tem servido para situar escritores até então sem uma classificação definida. Assim, a mesma indefinição do detalhe, do objeto, tanto na Pintura como na Música, é observada na Literatura. O escritor passa a lidar com “estados de alma”, no dizer de Hibbard, e até o enredo fica subordinado à situação daqueles “momentos”. A sintaxe perde a sua estruturação clara e é apenas esquematizada, levando em conta as necessidades expressivas para a captaçào do mundo subjetivo que o escritor quer retratar. Amado Alonso no ensaio Impressionismo em el Lenguaje, mostra que não há propriamente uma linguagem impressionista, mas algumas preferências por expressões subjetivas, simbólicas, que servem para aproximar certos escritores. E aponta o exemplo, muitas vezes freqüente, do abandono da ordem lógica da frase. E mais: o tratamento verbal para que o leitor tenha a sensação, não de uma descrição objetiva e onisciente do autor e sim de testemunha dos fatos apresentados. Assim, muitas vezes, escritores que à primeira vista pareciam tão distantes em sua maneira de concepção, podem ser aproximados por uma característica afim do estilo. No caso, Katherine Mansfield, Marcel Proust e outros.
No Brasil, o ficcionista Adelino Magalhães tem sido o mais freqüentemente apontado pelos críticos como impressionista. Algumas referências, nesse sentido, tem sido feitas igualmente em relação a Raul Pompéia, Graça Aranha e Cornélio Pena.