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As grandes exposições são cada vez mais raras em todo o Brasil. Responsáveis por levarem multidões aos museus nos últimos anos, as mostras estão tímidas desde o início de 2016. O motivo é a recessão econômica, que fez muitas empresas, conhecidas por serem as maiores patrocinadoras de projetos culturais, diminuírem os investimentos.

Dados disponíveis no Portal da Transparência do Ministério da Cultura (Salic) mostram que o apoio vem caindo ano após ano. Enquanto em 2015 o valor apoiado passou de R$ 1,3 bilhões, em 2016 não chega a R$ 250 milhões. Se a projeção se mantiver, o ano vai fechar com pouco mais da metade do total destinado em anos anteriores.

Em Minas Gerais, o maior museu de artes a céu aberto do mundo, o Inhotim, sentiu a retração. Um dos motivos foi, justamente, a queda nos investimentos. O idealizador do projeto e os principais apoiadores são do ramo na mineração, que ainda sofre com a baixa nas exportações. Conforme a diretora-executiva adjunta do Instituto Inhotim, Raquel Novais, foi preciso fazer cortes, que chegaram a 30% dos funcionários em dois anos.

'Nós reduzimos alguns setores administrativos e reduzimos algumas diretorias. Em 2014 tínhamos 750 funcionários. Em 2015 mantivemos esse número e hoje, 2016, temos cerca de 500 funcionários.'

Em São Paulo, o Museu do Ipiranga, luta para conseguir dinheiro para sua reforma. Fechado há três anos, teve o orçamento cortado em 30%. Com 300 mil reais a menos é preciso dar conta do pagamento de funcionários e da montagem de exposições itinerantes. Segundo a diretora em exercício do museu, Vânia Carvalho, a Universidade de São Paulo (USP), que administra o espaço, só tem dinheiro para o laudo estrutural.

'A partir daí, temos que fazer o projeto, o projeto executivo e depois a obra em si. Pra tudo isso, a universidade não tem dinheiro. Nós estamos muito próximos da gestão da universidade e eles estão com dificuldades no gerenciamento, na distribuição dos recursos. São muitas demandas, muitas unidades.'

Na contramão está o recém inaugurado Museu do Amanhã, no Rio de Janeiro. O conceito futurista e as exposições interativas têm garantido bons números de público e arrecadação. Desde a abertura, em dezembro do ano passado, foram 100 mil visitantes por mês. Conforme o diretor-presidente do museu, Ricardo Piquet, o fato de ter sido inaugurado durante a crise fez a gestão pensar em soluções a longo prazo.

'Ao longo do ano fizemos vários movimentos para reduzir a estrutura que havia sido pensada para a inauguração e que não cabia mais nesse orçamento. Contamos com o esforço adicional de vários parceiros para criar programação de alto nível com pouco investimento do museu. Procuramos fazer essa parceria com baixo custo.'

Piquet também é gestor do Museu Paço do Frevo, em Recife. Com menos de dois anos de atividade, o espaço pode encerrar as atividades por falta de dinheiro. O museu depende de repasses da prefeitura, que atrasaram, o que fez as contas fecharem no vermelho. Em 2015, funcionários chegaram a receber aviso prévio. Hoje não há certeza sobre a continuidade das atividades.

'Evidente que, como é uma instituição sem fins de lucro, não tem fundo reserva, não tem condições, por estatuto, de buscar recursos financiados. O espaço depende exclusivamente dos repasses do poder público. Se isso não vier, nós temos que repensar nossa gestão. '

A falta de repasses, públicos ou privados, é a preocupação de todos os gestores culturais atualmente, segundo a presidente do Comitê Brasileiro do Conselho Internacional de Museus, Maria Ignez Mantovani. Ela alerta, no entanto, que os cortes devem ser planejados. As áreas de pesquisa, por exemplo, precisam ser preservadas. Para ela a crise é, também, uma oportunidade de reinvenção e de aproximação com o público visitante.

'Em um momento como esse, talvez, a curadoria está tendo que trabalhar mais, ser mais inventiva. É preciso usar o próprio acervo para traçar estratégias e criar um maior envolvimento do público. Então eu vejo que vão sobreviver bem à crise aqueles museus que souberem enfrentar a situação com coragem.'

A "reinvenção caseira" é a tática de museus tradicionais, como MASP e MAM, em São Paulo. Os dois passaram a explorar as obras próprias, em exposições mais acessíveis ao público. O Museu de Arte Moderna, por exemplo, prevendo a queda nos patrocínios, planejou bem cedo o ano de 2016. O primeiro passo foi reduzir o número de exibições. Enquanto em 2015 foram oito grandes mostras, em 2016 não passarão de cinco. Para poupar, a opção do curador do MAM, Felipe Chaimovich, foi cortar "de cara" as exposições internacionais.

'Por conta da incerteza quanto a taxa de câmbio que tínhamos no ano passado, decidimos que não traríamos exposições de fora do Brasil. Nós também fizemos exposições com duração maior daquelas que acostumávamos a fazer. Também aproveitamos para fazer mais exposições com o nosso acervo.'

As soluções domésticas não são exclusividade dos museus brasileiros. A experiência é antiga na Europa. A presidente do Comitê Brasileiro do Conselho Internacional de Museus, Maria Ignez Mantovani lembra que espaços tidos hoje como os mais importantes do mundo viram no próprio acervo a receita para sair da crise, sem depender apenas dos investidores.

'As exposições grandiosas, que vemos hoje ao redor do mundo todo, foram uma forma que os museus internacionais de grande porte descobriram para que eles pudessem fazer circular os seus acervos, recebendo por esses empréstimos. Essa moeda é, hoje, sem dúvida, parte da estrutura econômica de sustentação desses museus.'

No Brasil, na esfera pública, os museus federais também sofrem com o aperto nas contas. O Instituto Brasileiro de Museus (IBRAM), órgão responsável pela gestão deles, terminou 2015 devendo R$ 10 milhões. Para 2016, a sinalização do que pode ser um alívio. Na quinta-feira, o Ministério da Cultura aprovou um aporte de mais de R$ 230 milhões para sanar a dívida do governo com os museus federais.

Fonte: CBN